Dia Estadual de Combate ao Feminicídio: no Piauí, a cada 15 dias uma mulher foi vítima em 2022
Esta sexta-feira (27) marca o Dia Estadual de Combate ao Feminicídio. No Piauí, a cada 15 dias uma mulher foi vítima da violência de gênero. Além disso, há 12.348 medidas protetivas para vítimas de violência doméstica tramitando. Os dados são referentes somente aos cinco primeiros meses de 2022, conforme o Painel de Monitoramento da Violência contra a Mulher no estado.
Em 2022, onze mulheres já perderam a vida vítimas de feminicídio, caracterizado como o ápice da violência, que geralmente começa por agressões verbais e ameaças.
Entre os casos que mais geraram comoção, está o da doméstica Valdirene Torquato, assassinada a facadas no dia 25 de janeiro deste ano, em Teresina. Um vídeo feito por testemunhas mostra o momento em que o suspeito, Ezequiel Rodrigues Araújo, fugiu do local do crime com uma faca na mão. A audiência de instrução e julgamento do caso começou na terça-feira (24).
Nessa quinta-feira (26), também foi iniciada a audiência de instrução e julgamento do tenente aposentado da Polícia Militar Pedro José de Oliveira, preso desde 26 de janeiro pela morte a tiros da sua ex-mulher, Marilena Pereira da Rocha. Vídeos de câmeras de segurança mostram o homem próximo à casa da ex-mulher no dia anterior ao crime.
Ferramentas tentam reduzir casos
Entre as ferramentas desenvolvidas para o combate à violência de gênero no Piauí, está o aplicativo Salve Maria. A ferramenta, desenvolvida pela Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos e pela Agência de Tecnologia da Informação do estado (ATI), já registrou, desde 2018 a março deste ano, 2.353 denúncias de violência. Destas, 79% são físicas e 21% referem-se às violências moral, patrimonial e psicológica.
Para a delegada de Polícia Civil Eugênia Villa, uma das responsáveis pela criação do aplicativo, a tecnologia permite um atendimento mais ágil às vítimas de violência no Piauí.
“Pra chegar na casa de uma pessoa, precisamos de ordem judicial, a denúncia tem que estar institucionalizada. Pra chegar antes, só mesmo a tecnologia. Não foi uma pessoa que criou esse aplicativo. Esse aplicativo nasceu de uma necessidade, de uma política que nós visualizamos”, comentou.
O analista de sistema da ATI e desenvolvedor do aplicativo Salve Maria, Carlos Júnior, destaca que a ferramenta é prática e de fácil compreensão, criada a partir de dois botões de emergência.
“Uma vez instalado, você vai ver dois botões. É o botão do pânico e o da denúncia. O do pânico, como o nome já diz, é quando a mulher está em situação de risco de vida. Quando for pressionado, vai tocar um alarme à Polícia Militar, que faz com que as pessoas que estão lá de plantão corram para o atendimento. É enviada a viatura que está mais próxima daquele local, porque é enviada a localização real de onde foi pressionado o botão”, explicou.
“No caso do botão de denúncia, isso pode ser feito por alguém que conheça a vítima. É fornecido um formulário, onde tem alguns campos que vão ser preenchidos com o nome da vítima, do agressor, tipo de violência que tá acontecendo”, acrescentou o analista.
O aplicativo pode ser baixado gratuitamente em celulares com tecnologia iOS e Android e já é utilizado também nos estados Maranhão e Alagoas. Usuários, no entanto, ainda relatam falhas na ferramenta.
“Nós temos problemas com, por exemplo, internet. Essa mulher tá em um local onde tem uma internet satisfatória? Pode não estar. O Salve Maria funciona com Internet. A Polícia Militar está realmente atendendo aquela demanda? Pode ser que não, que naquele momento não tenha viatura pra atender aquela demanda, como não teria pra outra”, completou a delegada Eugênia Villa.
Em entrevista à TV Clube, a Cláudia Modesto relatou ter sido vítima de violência durante o casamento. Ela se divorciou do ex-marido há sete anos e hoje tem medidas protetivas contra o homem. Durante uma das agressões, ela conseguiu solicitar ajuda policial pelo celular.
“Sofria todo tipo de violência. Eu não tinha esse entendimento porque eu já estava adoecida e não percebia que isso já era uma violência psicológica. É importantíssimo você fazer uma denúncia. Olha o meu caso, se eu não tivesse feito uma denúncia em 2009 e tivesse guardado [para mim]…”, refletiu.
A mulher ressaltou ainda a existência da violência institucional, que se caracteriza como situações de violência, ou potencialmente geradoras de sofrimento e estigmatização, provocadas por agentes ou instituições públicas. Segundo ela, a demora na conclusão de processos judiciais referentes à violência contra a mulher são um exemplo da prática.
“Não se tem uma definição desses processos, são processos que não findam. Isso também é violência institucional. Quando uma mulher tem coragem de fazer essa denúncia com agressores e abusadores, eles entram com processo de alienação parental, querendo tomar nossos filhos”, completou Cláudia.
No Piauí, mulheres vítimas de violência à espera de medidas protetivas contra agressores podem recorrer também à casas de abrigo, locais sigilosos disponibilizados pela Secretaria de Estado da Assistência Social, Trabalho e Direitos Humanos (Sasc).
“A mulher fica sob proteção do Estado. O endereço é sigiloso, nosso telefone é sigiloso. Os contatos com familiares só são permitidos através da equipe, isso tudo pra garantir a proteção da mulher, que após denúncia, não se sente segura pra voltar ao seu domicílio”, explicou uma mulher, que não terá a identidade revelada.
Como denunciar
Quem for vítima ou presenciar situações de violência doméstica, pode acionar a Polícia Militar, no momento da ocorrência, pelo número 190, ou contatar o número 180, do Central de Atendimento à Mulher do Governo Federal. A Polícia Civil pode ser acionada por meio das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam).
Em Teresina, o Centro de Referência Francisca Trindade recebe denúncias através do WhatsApp, pelo número (86) 99433 0809. No local, tanto vítimas, como vizinhos ou familiares das vítimas, podem tirar dúvidas de ordem jurídica e psicossocial. A coordenadoria disponibiliza ainda o e-mail ouvidoria.mulher@cepm.pi.gov.br.
Há ainda iniciativas como a do Instituto Esperança Garcia, que pode ser acionado pelo telefone (86) 99416 9451.
“O enfrentamento à violência contra a mulher é uma responsabilidade do Estado, mas também da sociedade civil. A gente tem que unir essas forças porque o machismo está dentro de toda a sociedade, nas organizações e instituições públicas e privadas. Então, se cada um fizer sua parte, a gente consegue avançar e menos mulheres morrerão”, afirmou a coordenadora estadual de Políticas para Mulheres, Zenaide Lustosa. G1-PI