Juiz visita buraco onde homem vive há 25 anos para decidir sobre ação

buracoDe dentro do buraco que ele mesmo cavou e onde vive há 25 anos, Antônio Francisco Calado,

57, teve um dia diferente na última terça-feira (27). Acostumado a ficar sempre sozinho,

ele recebeu a visita do juiz Everton Pereira Santos. O magistrado foi até a “casa”,

construída em uma pequena e inóspita propriedade rural de Nova Roma, no norte de Goiás,

para inspecionar a situação e se posicionar a respeito de dois processos de pensão por

morte dos pais e um de interdição judicial envolvendo o homem.Tudo começou quando a irmã e curadora de Antônio, Raimunda Tereza Calado, entrou na Justiça

para provar que ele era incapaz e poderia ter acesso ao benefício. Uma audiência até foi

marcada, mas Antônio não compareceu. Diante da situação, o magistrado, responsável pela

comarca de Iaciara, percorreu 50 km de carro e mais 1 km a pé para checar, com seus

próprios olhos, as condições do “homem do buraco”, como é conhecido.Santos diz que ficou intrigado com o que encontrou. “Olha, é uma situação muito peculiar,indescritível. Ao mesmo tempo em que ele aparenta ter muita inteligência para usar técnicas na construção do buraco e manusear ferramentas, demonstra aparentes delírios, dizendo que conversa com os raios e trovões”, disse.Em perícia já realizada, Antônio foi diagnosticado com esquizofrenia paranoide perturbação mental grave caracterizada pela perda de contato com a realidade, alucinações e crenças falsas.
Diante dos documentos e da inspeção ao local, o juiz deliberou pelas duas pensões –

relacionadas às mortes do pai, em 2000, e da mãe, 12 anos depois – cada uma no valor de um

salário mínimo. A decisão também contempla o período retroativo, que resulta em um valor

aproximado de R$ 70 mil.
buraco-2Segundo o magistrado, Antônio não fala “coisa com coisa” e não consegue estabelecer uma

linha de raciocínio clara e linear. Apesar disso, mostra lampejos, principalmente

relacionados à construção, que fazem Santos acreditar até em coisa de outro mundo.
“Ele criou um sistema para que a água da chuva não entre no buraco e ele poder utilizá-la

depois. É fantástico. Quem ensinou isso para ele? Tenho a impressão que ele tem contato com

outro ser. Ele se inspira em alguém, é muito estranho”, diz.
A residência de Antônio também impressionou o juiz. A construção, em formato oval e com

aproximadamente 8 m², tem os cômodos divididos e só é possível chegar a pé. Ao entrar,

existe a sala. De um dos lados, um oratório com duas imagens de santos e do outro o quarto,

onde ele dorme sobre um pedaço de madeira com panos velhos.O homem cozinha do lado de fora com utensílios sujos e rudimentares. A comida é tudo que ele encontra na natureza: pequi, pimenta e outras verduras cultivadas no local. Antônio não come carne.
A irmã afirmou ao juiz que já tentou tirar o homem do local várias vezes, mas ele nunca

aceitou a ideia. “Ele é muito arredio. A irmã falou que para manter uma convivência com ele

é preciso três coisas: não pedir para ele tomar banho e trocar de roupa, além do mais

importante, não pedir que ele saia de lá”, explica.Como Antônio é incapaz, a irmã é quem vai administrar os benefícios. Segundo o juiz, ela será monitorada para fazer bom uso do recurso.”Já pedi ao MP que acompanhe o gasto do dinheiro. Recomendei ainda que, mesmo a contragosto dele, sejam feitas melhorias no local, como a construção de um barraco e a utilização de água tratada”, exemplifica. G1

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